Brasil, estado monolinguístico?

Você está andando na rua e ouve conversas aleatórias de outras pessoas que também andam na rua. No meio do burburinho, você escuta alguma coisa que não se parece com português. A sua reação é imediata: vira a cabeça em todas as direções tentando localizar o gringo tagarela.

Por que será que reagimos com essa curiosidade afoita, como se alguém falando outra língua no Brasil fosse tão raro quanto um ornitorrinco?

Existe no Brasil um movimento geral de uniformização linguística. Temos a impressão de que vivemos em um país de uma língua só – o que não é bem verdade.

Essa política linguística de padronização acontece principalmente por motivos sociais e políticos. Mas é curioso que muitas pessoas internalizam esse tipo de regra por si só sem nenhum tipo de obrigação externa.

Avisio: Esse é um post em constante reelaboração e aprimoramento. Se você tem mais informações sobre o assunto e gostaria de apontar acréscimos, correções ou aprimoramentos, sua contribuição será muito bem-vinda na caixa de comentários!

É impressionante a quantidade de mães que se recusam a educar seus bebês bilíngues com medo de que isso vá “confundir” a cabeça da criança ou prejudicar seu desenvolvimento cognitivo.

Se isso fosse verdade, teríamos populações inteiras de vários países com distúrbios psicológicos. Todos os filhos de imigrantes criados falando a língua dos pais também seriam perturbados. Bom, é claro que isso não faz muito sentido.

Já comentamos antes aqui que o plurilinguismo é uma realidade concreta em muitos lugares.

No Brasil, a imposição de uma política de idioma único tem consequências difíceis de ignorar.

Um caso recente de destaque é o desempenho fraco dos estudantes do programa Ciências sem Fronteiras nas provas de inglês. A própria Polícia Federal não tem agentes preparados em inglês para atender os refugiados que chegam no Brasil.

Bom, e porque isso acontece?

O Brasil é imenso. Realmente imenso.

Aquele clichê de que o Brasil é um país de proporções continentais interfere bastante nesse ponto.

Na Europa, falar muitas línguas é uma questão de sobrevivência.

A maioria dos países é menor do que um estado brasileiro. Na maioria das vezes, a gente esquece desse fato, mas ele ajuda a entender nosso espanto na historinha do gringo que coloquei no começo desse post.

 Só para confirmar essa lenda, resolvi fazer um pequeno teste usando o Google Maps.

Uma viagem de carro pelos 4200 kilometros de entre o Porto [Portugal] e Kiev [Ucrânia] demora cerca de 48 horas – excluindo as pausas pelo caminho.

Ah sim! É bom lembrar que esse não é o caminho mais curto. Alterei o trajeto de propósito para cruzar a Itália, a Suíça e a República Tcheca.

Para ter uma noção concreta, essa mesma distância dá para cobrir uma viagem de Pelotas [RS] até Fortaleza [CE].

A diferença é que estamos dentro do mesmo país e, apesar das diferenças, ainda não precisamos comprar um guia de idiomas para turistas.

É claro que há variações aí. Mas, de um jeito ou de outro, você está falando a mesma língua.

Tente pensar na situação contrária. Imagine a variedade de idiomas que você encontraria nessa viagem imaginária do Porto até Kiev.

Pois é.

O Exterminador de Línguas

Mas o gigantismo geográfico não é o único fator.

Países que buscam uma unificação nacional sólida tentam apagar as diferenças regionais, o que inclui também a imposição de um modo único de falar. O Brasil também se inclui nessa lista de esterilizadores de idiomas, especialmente no caso das línguas indígenas, das quais quase 190 estão ameaçadas de extinção.

Nesse ponto, nossas diferenças com nossos vizinhos latinoamericanos são abismais. Nos países andinos, as línguas ameríndias resistiram ao apagamento cultural da colonização e ainda persistem na vida cotidiana, mesmo que o espanhol seja o idioma oficial.

Em alguns casos, as línguas indígenas são tão presentes que alcançam o estatuto de língua oficial. É o que acontece com o quechua e o aimará na Bolívia. O Paraguai tem duas línguas oficiais: espanhol e guarani.

Já no Brasil, a visibilidade das línguas indígenas foi reprimida ao máximo.

Continuamos fingindo ser um país de uma língua só, apesar de haver 237 línguas no território brasileiro.

Além do caso gritante de extermínio das línguas nativas, também temos de relembrar as proibições de idiomas por problemas político, como o alemão o japonês e o italiano.

Essa uniformização linguística é tão forte que atinge inclusive as variações do próprio português. Tente se lembrar de qualquer piadinha com o jeito de falar nordestino, mineiro ou gaúcho. Você logo entenderá o que estou falando sem precisarmos entrar em detalhes muito específicos.

Já reparou como essa repressão às vezes pode ser feita de maneira maliciosa e sutil?

A grama do vizinho é sempre mais verde – a língua não

A última prova indestrutível dessa política monolinguística é nossa impermeabilidade à língua dos países vizinhos ao nosso.

Por algum motivo, nós brasileiros temos alguma resistência irracional a se matricular em um curso de espanhol e aprender a falar de verdade. Apesar de absolutamente todos os países vizinhos do Brasil usarem o espanhol, poucas pessoas se dão o trabalho de estudar com seriedade.

Recentemente, o espanhol foi inserido na grade curricular do ensino básico. Isso já é uma ótima notícia e um primeiro passo para acabar com essa mistura de fobia e preguiça que temos com o espanhol.

Ainda assim, é frustrante procurar alguém que se dedique a aprender bem espanhol e não fica enrolando com aquele ‘portunhol’ horrível.

Para concluir

Se nos deixarmos levar pelo fluxo da correnteza, dá a impressão que o Brasil inteiro vai falar igual ao William Bonner da noite para o dia. É claro que isso está muito longe de acontecer na prática. Mas mesmo assim, continuamos nos comportando como se

  • todo os brasileiros falassem apenas português
  • o português fosse uma língua uniforme
  • não fosse importante ou necessário aprender outras línguas – nem sequer a dos nossos vizinhos hermanos.

Estudar alemão é difícil? Pode até ser. Mas estudar qualquer língua estrangeira é difícil!

Ainda mais quando a pessoa insiste em se agarrar a essa mentalidade monolinguística, enraizada tão profundamente na nossa cultura. Com esse tipo de atitude, aí sim fica impossível aprender alemão. Aliás, fica impossível aprender qualquer idioma, qualquer que seja.

Apenas ignore que ninguém entende por que você dedica tanto tempo e energia para aprender alemão.

Apenas ignore que nenhum de seus amigos fala ou estuda alemão.

Apenas estude.

Gostou do post?

Obrigado por acompanhar o Germanofonia!

Se você gostou desse post, então continue acompanhando nossas atualizações por aqui, mas também no Facebook, no Instagram e no Pinterest. Siga as páginas e não perca nenhuma de nossas dicas!

Se você já tem conhecimentos no idioma e quer se manter progredindo no idioma mesmo com uma rotina lotada, entre para a Jornada “Destrave seu alemão em 50 dias” e receba técnicas e estratégias diretamente por e-mail.

Agora, se você já tem algum nível no alemão e quer se manter progredindo no idioma, considere entrar para o Clube de Conversação Germanofonia.


Descubra mais sobre Germanofonia

Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.


Comentários

Uma resposta para “Brasil, estado monolinguístico?”

  1. […] contrário do imaginário monolíngue brasileiro, em muitos países é absolutamente comum utilizar três idiomas – um para o ambiente […]

Descubra mais sobre Germanofonia

Assine agora mesmo, tenha acesso à versão completa com recursos adicionais e nunca mais perca nenhuma novidade!

Continue lendo